segunda-feira, 24 de maio de 2010

Era uma vez...

Certa noite, já bem longe da hora de jantar, ouvi a minha avó a chamar por mim:

- Ritinha, anda cá! Ritinha!

Era raro aquele acontecimento. Um chamamento real, genuíno, empolgado...
- Já vou, avó. Estou a arrumar a cozinha.

Levantei a mesa à pressa, equilibrando o meu prato, o da minha mãe e o do meu pai, em pilha, que sustentavam três copos com um restinho de sumo no fundo e os talheres engordurados. Com a mão vaga, segurava a saladeira cheia de azeite, vinagre e as sobras de alface e cebola.

Num momento de profunda concentração, ouvi outra vez:

- Ritinha! Depressa! Anda cá!

Ao tiro da partida, caíram os talheres, rodou a saladeira sobre a palma da mão, tropeçaram-se os pés um no outro.

Pousei a "tralha" na bancada e corri a passos largos até ao quarto da minha ansiosa avó.

- Que queres, 'vó?

- Vou contar-te uma história... - indicou ela, olhando para a sua mão enrugada pela sabedoria da idade.

Olhei, inclinei a cabeça para o lado, como quando se quer entender melhor alguma coisa, e escutei:

- Eu e a minha mão somos conhecidas há muito, mas muito tempo...- iniciou.

Pensava: "Que sairá daqui...?".

- Era uma vez, cinco malandros.
Este aqui (demonstrou, abanando o dedo mindinho) é um pobrezito... É o mais pequeno de todos e por nenhum outro é respeitado.
Mas este (tremelicou agora o dedo anelar) é como um passarinho... Sempre a cantar e a bailar.
O do meio (encolheu os outros deditos envelhecidos) é o Rei! Acha-se importante e impõe as suas regras...
O primeiro é um maroto (apontou o olhar para o dedo indicador)...! É conhecido por todos como o "fura-bolos". Um guloso nato...!
O último (fez sinal de "fixe") gosta de ir à caça...! É um verdadeiro mata-piolhos! Crrr crrrr!


Sorri, sorri pela inocência do relato, pelo riso da minha avó e pelo brilho dos seus olhos ao terminá-lo...

Uma sensação de pura satisfação...

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Ser... a sonhar...

Na noite mórbida, fragilidade de recém-nascido surge...

Cerram-se os dois milagres, para não ver; sustém-se as pernas contra o peito, para não entrar; cobre-se o corpo num invólucro doce e genuíno, para não sentir...


Ali se fica... Ali se abstrai... Ali se sonha...


Num outro ar, criatividade de criança emana...

Abre-se as asas, para conseguir; solta-se o cabelo, para pairar; descerra-se o mundo, para conseguir voar...


Ali se quer... Ali se renasce... Ali se liberta...



O sopro de Éolo despertou a mente... Trouxe-me de volta, deixei de sonhar...

segunda-feira, 17 de maio de 2010

A emoção das palavras...

Os sons das letras, o jogo das sílabas, o toque das palavras, a voz do sonho...

Ensinam-nos o "A, E, I, O, U", articulam-nos o "Pa, Pe, Pi, Po, Pu", educam-nos para "O amor é fogo que arde sem se ver", expõem-nos ao Mundo...

Escrevemos com alma, pensamos com o coração, imaginamos a imaginação...

Cada dia que passa, aprendemos, erramos, apagamos, refazemos, compomos...


A emoção das palavras... (des)espera-se nas entrelinhas...

sábado, 8 de maio de 2010

E se...

Se eu estivesse,
Se eu olhasse,
Se eu dissesse,
Se eu soubesse,
Se eu fizesse,
Se eu falasse,
Se eu cantasse,
Se eu saltasse,
Se eu sonhasse,
Se eu voasse,
Se eu chorasse,
Se eu gritasse,
Se eu fugisse,
Se eu partisse,
Se eu escondesse,
Se eu falhasse,
Se eu caísse,
Se eu forçasse,
Se eu parasse,
Se eu dormisse,
Se eu acordasse,
Se eu respirasse,
Se eu andasse,
Se eu amasse,
Se eu beijasse,
Se eu abraçasse,
Se eu tivesse,
Se eu perdesse,
Se eu encontrasse,
Se eu descobrisse,
Se eu brilhasse,
Se eu fundisse,
Se eu mingasse,
Se eu crescesse,
Se eu vivesse...

E se eu não quisesse?!